terça-feira, 27 de janeiro de 2009

“A vida é como uma caixa de chocolates: você nunca sabe o que vai encontrar”





O CURIOSO CASO DE BENJAMIN BUTTON


Por Angélica Bito (http://cinema.cineclick.uol.com.br/criticas/index_texto.php?id_critica=10095)
No longínquo século 19, o escritor irlandês Oscar Wilde abordou o envelhecimento de forma fantasiosa no romance O Retrato de Dorian Gray, no qual o personagem principal, um homem extremamente vaidoso, enlouquece ao permanecer jovem, enquanto um retrato seu, escondido num armário, envelhece. Tendo como base um conto do escritor norte-americano F. Scott Fitzgerald, O Curioso Caso de Benjamin Button também aborda a questão do envelhecimento de uma forma bizarra, numa história fantástica, mas com tons otimistas, diferentemente da história de Wilde.

Benjamin Button (Brad Pitt) nasceu em circunstâncias extraordinárias, como ele mesmo define, no dia em que a Primeira Guerra Mundial terminou, em 11 de novembro de 1918. Enquanto as pessoas comemoravam o fim do conflito nas ruas de Nova Orleans, nos EUA, nascia o protagonista desta fábula, sobrevivente de um parto que acabou levando a vida de sua mãe. Mas ele nasce com uma doença: um bebê velho, à beira da morte, que rejuvenesce na medida em que os anos avançam. Desta forma, ele está fadado ver morrer todos que ele ama, numa trama sempre pontuada por nascimentos e mortes. Abandonado pelo pai, Thomas Button (Jason Flemyng), na porta de um asilo, é acolhido por Queenie (Taraji P. Henson), que, considerando aquele bebê idoso um milagre de Deus, o acolhe como filho.

Acompanhamos a fábula por meio de um diário escrito pelo protagonista, que, no fim de sua vida, foi parar nas mãos de Daisy (Cate Blanchett), o amor de sua vida, que se encontra no leito de morte enquanto o furacão Katrina ameaça destruir Nova Orleans, o que realmente ocorreu em 29 de agosto de 2005. Aliás, depois de Déja Vu (2006), esta foi a segunda produção hollywoodiana a ser rodada na cidade. A cidade já estava prevista como locação para o filme, rodado entre 2007 e 2008, mas os estragos causados pelo desastre natural - que matou cerca de 1.500 pessoas, destruiu mais de 100 mil casas e deixou prejuízos superiores a US$ 80 bilhões - colocaram em risco a realização das filmagens. Sensibilizado pelos efeitos da catástrofe, Pitt viu de perto a calamidade da situação durante as filmagens e, após a conclusão do filme, anunciou o projeto Make It Right, que tem como objetivo a construção de casas ecológicas na região. Em dezembro de 2008, as seis primeiras casas foram entregues à população. As 150 moradias previstas serão construídas acima do nível do solo, para evitar futuras inundações. Enquanto sua filha, Caroline (Julia Ormond), lê o diário, a história de Benjamin desenvolve-se na tela.
Por mais que seja uma fábula fantasiosa, a história de O Curioso Caso de Benjamin Button é capaz de conquistar o espectador por manter-se com o pé na realidade, visto os dois acontecimentos notórios que marcam o início e fim da história, a Primeira Guerra Mundial e o furacão Katrina. Os personagens tornam-se críveis simplesmente por terem testemunhado fatos que realmente aconteceram.
O Curioso Caso de Benjamin Button marca a terceira parceria cinematográfica entre o diretor David Fincher e o ator Brad Pitt, depois de Seven - Os Sete Crimes Capitais (1995) e Clube da Luta (1997). Neste filme, Fincher experimenta uma direção mais clássica ao contar esta bela fábula, que não lança mão da violência estética das duas outras produções protagonizadas por Pitt. Parece que Fincher amadureceu, assim como o ator. Mesmo desenvolvendo um trabalho mais clássico e convencional na direção, Fincher ainda é capaz de compor cenas belíssimas, inesquecíveis, de uma forma especialmente sensível, como se estivesse conduzindo uma verdadeira ode à vida, ao amor, aos relacionamentos e às pessoas que passam por nós. Percebe-se um envolvimento apaixonado de toda a equipe com esta história. Redundante dizer que Pitt, em particular, apresenta-se especialmente inspirado como o protagonista, independente das cinco horas de maquiagem às quais era submetido diariamente para aparentar velho.
Em tempo: Pitt envolveu-se tanto com este projeto que levou sua filha Shiloh Jolie-Pitt, recém-nascida na época, aos sets de filmagem, fazendo até uma ponta no longa.


Mais do que um filme sobre tempo, idade, perdas e ganhos, a belíssima fotografia e cenários transportam o espectador para dentro da história. São quase 3 horas de filme, que mal são sentidas diante da beleza, simplicidade e clareza com que Benjamin encara sua vida. Apesar de ter nascido velho e morado em um asilo a maior parte do tempo, ele, mesmo sabendo que é diferente, não se rebela. Aceita, aprende com as pessoas que estão lá. Seja ao aprender piano, seja ao aprender a perder as pessoas, seja ao aprender a amar.
Mesmo sabendo da sua verdadeira família, Benjamin não se esquece de quem realmente o acolheu, e Queenie sempre é lembrada como sua real mãe.
Uma das cenas mais bonitas é quando, exatamente no meio das suas idades, ele reencontra Daisy. Eles sabem que nada dura para sempre, mas mesmo assim tendem a viver aquela vida até quando for permitido para eles. Sem cobranças, sem norma. Vivem em uma casa sem móveis, e vão construindo a vida deles ao som de Beatles. O momento mais dramático é quando Benjamin fica sabendo que será pai e a alegria e tristeza tomam conta do seu semblante. Ele sabe que não pode ser pai, Daisy não pode cuidar de duas crianças. Quantas pessoas teriam essa coragem, de se afastar quando sabem que é inevitável, quando se faz isso para o bem? Quantas pessoas não seriam egoístas e fariam isso?
Entre momentos de quase lágrimas, como o citado, há momentos de risos também, afinal de contas, se a vida não é cor-de-rosa, negra ela também não é.
"A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás; mas só pode ser vivida olhando-se para a frente".


Palmas para o brilhante trabalho de maquiagem, por fazer Brad Pitt ficar feio e velho, mais jovem e mil vezes mais bonito.

O Curioso Caso De Benjamin Button pode ser um filme cheio de chavões, mas nos faz parar para pensar e refletir.

É viver a vida doando-se, sem esperar nada, em exigir nada. Sabendo que um dia tudo vai acabar.


É algo que só pode ser sentido e explicado vendo.

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